sexta-feira, 31 de maio de 2024

2024

É quase como se eu estivesse tentando ser uma paladina, quando era pra ser só uma druida maluca vagando por aí. 



quarta-feira, 29 de maio de 2024

Tema de pesquisa em linguística

A identidade da variedade carioca: palavrões como advérbios de intensidade. 

Num estado em que a frase "porra é vírgula" já pode ser considerada canônica, uma pesquisa científica para sistematizar o uso dos palavrões "porra e caralho" na posição de advérbio de intensidade, chocaria a academia. Mas... Por que não? Consigo visualizar uma carioca apresentando o trabalho na beca, alçamento de verbo isso, fatores socio-históricos, pá, diversidade cultural aquilo, apagamento da carga semântica chula e tal, para, no final, todos poderem dizer - sem receio - que "essa pesquisa é do krl".

Imagina? Eu consigo imaginááááá.

Querido Deus,

Obrigada por agir tão rápido, mesmo eu não merecendo. Mesmo eu não compreendendo o seu tempo. Num dia eu me vejo acuada, no outro o senhor manda uma joaninha vermelha, de pintinhas pretas, linda, subir nove andares de um prédio deselegante, no meio de uma cidade horrivelmente barulhenta, só pra me ver. Há muito tempo que eu não vejo uma joaninha, tanto, que eu já tinha esquecido o significado que tem uma joaninha pousar na gente. Mas eu sabia que era coisa boa; e ela era a joaninha mais perfeita que eu já tinha visto na vida. 

É muito difícil recuperar o fôlego (aliento), mas é mais difícil deixá-lo ir completamente quando tenho motivos vívidos para acreditar que há coisas boas por vir. Obrigada novamente.

sexta-feira, 24 de maio de 2024

Sentido

Eu quero mais é a dor de ser gente 

e esse medo macabro de já não o ser.


Quero a angústia de quem sente,

se ressente por sentir,

mas se dói dos insensíveis.


RIBEIRO, Nara. Sentido.

quinta-feira, 23 de maio de 2024

Diálogos cariocas sobre o ingresso no ensino superior

 - Mãe, passei pra faculdade.
- Pra que isso, minha filha? Daqui a pouco você se casa.

- Mãe, passei pra faculdade.
- Toma aqui, meu filho, vai ser feliz. (e entrega um RioCard)

- Mãe, passei pra faculdade.
- Olha o que eu comprei pra você! (e entrega uma bolsa térmica para carregar marmitas)

- Mãe, passei pra faculdade.
- ... (e dá a chave de um carro zero) 

Primeiras impressões de apresentações em meio acadêmico resumido numa poesia (mas depois fica tudo bem)

 Nunca conheci quem tivesse levado porrada. 

Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo. 

E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil, 
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita, 
Indesculpavelmente sujo, 
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho, 
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo, 
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das 
etiquetas, 
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante, 
  

[...] 

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo 
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho, 
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida... 

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana 
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia; 
Que contasse, não uma violência, mas uma covardia! 
Não, são todos o Ideal, se os ouço e me falam. 
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil? 
Ó príncipes, meus irmãos, 

Arre, estou farto de semideuses! 
Onde é que há gente no mundo? 

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra? 

[...]  

 
Eu, que venho sido vil, literalmente vil, 
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza. 

 

CAMPOS, A. Poema em linha reta. Disponível em: <http://arquivopessoa.net/>. Acesso em: 16 maio 2024 

terça-feira, 21 de maio de 2024

Do fax ao Teams

Quando eu era muito pequena, fui ao trabalho com a minha mãe. Mas eu era muito pequena mesmo, era do tempo que eu corria dando pequenos pulinhos e meu cabelo crescia pra cima. Era um tempo em que as repartições dos escritórios não iam até o teto e o barulho dos fax chegando não parava. Minha mãe tinha a própria sala, com uma mesa grande, telefone, porta treco e um enormíssimo computador. Eu queria mexer em tudo, correr por todos os lados, ainda estávamos nos anos 90 e eu tinha, no máximo, 4 anos de idade. Tenho a sensação de que temos uma foto minha desse dia no trabalho da minha mãe, comigo em cima da mesa, não me lembro se fingindo que falava ao telefone, provavelmente isso mesmo. 

Essa semana me deu uma vontade incontrolável de comer uma fatia de torta, daquelas bem lindas, bem tortudas mesmo. Coloquei a minha mãe na frente do notebook do trabalho, o headset na cabeça e disse: "Não clica em nada, vai assistindo a palestra que ninguém vai saber que não sou eu. Quando eu voltar, você me conta o que o homem disse". "Mas e se alguém falar com você? O que eu faço? O que eu tenho que apertar?". "Mãe, não precisa apertar nada. E pode ignorar quem falar, porque é como se eu estivesse na reunião, entendeu?". "Ta bem, vai lá. Aproveita e traz um biscoito daqueles de amendoim também, ta?". "¬¬"

Atravessei a rua para comprar os dois pedaços de torta pra gente comer. Pelo celular, eu tenho o aplicativo do chat do trabalho e vi que tinha gente falando comigo. Comprei a torta, desisti do biscoito de amendoim e voltei correndo pra casa. Não levei 10 minutos na rua. Estava ela com uma caneta cor de rosa, anotando um monte de coisa num papel aleatório da minha mesa: "Esse homem da palestra é muito bom, até anotei umas coisas pra você aqui, oh (...)" Mesa bagunçada, quarto com bichinho de pelúcia, headset rosa de guerra e pijama. Só faltou a foto dela num "dia" no meu trabalho.

quarta-feira, 15 de maio de 2024

O alimento

 A gratidão me salvou de mim mesma. 

Sentir o sabor do queijo devagarinho e o creck do pãozinho recém saído da torradeira. É um dos momentos altos do meu dia. O café com leite, morno na temperatura ideal que não me queima, é o líquido mais simples e precioso, disputando espaço no meu coração apenas com o bubble tea.

Quando você se dá conta de que come alimentos frescos, de que come aquilo que gosta, de que você pode inclusive escolher, entende o que é riqueza. Café da manhã, almoço, lanche, janta, tudo isso alimenta também a alma.

Miguel está sempre comendo pizza. E ele ama, parece um Tartaruga Ninja. Nunca vi alguém para gostar tanto de pizza na vida. 

A comida em Studio Ghibli, a comida em "O oceano no fim do caminho", a comida na minha família, na família dos meus amigos. A comida que o Rafa anseia fazer para receber os amigos na casinha que sonha ter. 


Recomendações:

Cooked

Tomando te, Chava Flores  

Chiki ori

Street food Asia/Buenos Aires

Espólios 2

 O que tem de brechó no Centro de Curitiba não é brincadeira. A proporção de brechós lá é similar a de sebos na Argentina. Sei lá porquê, a organização das ruas, os prédios baixos e sua arquitetura também me lembraram a capital bonaerense. É porque já fui um par de vezes a esses lugares? É por serem realmente parecidas? 

Estão aí dois lugares para os quais eu voltaria muitas e muitas vezes.

As tecituras

Um artigo científico da Letras é como um trabalho de crochê. Fazer as partes demanda muita paciência.

Fazer já costurando é muito mais difícil.

Espólios 1

Senti o cheiro do verão no seu cangote, o cheiro do frescor, do café com pão de que me alimentaria todos os dias com a mesma satisfação, de manhãzinha, à tarde ao por do sol e à noite, na ceia. 

segunda-feira, 13 de maio de 2024

Poema aos homens do nosso tempo

Enquanto faço o verso, tu decerto vives.
Trabalhas tua riqueza, e eu trabalho o sangue.
Dirás que sangue é o não teres teu ouro
E o poeta te diz: compra o teu tempo.

Contempla o teu viver que corre, escuta
O teu ouro de dentro. É outro o amarelo que te falo.
Enquanto faço o verso, tu que não me lês
Sorris, se do meu verso ardente alguém te fala.

O ser poeta te sabe a ornamento, desconversas:
“Meu precioso tempo não pode ser perdido com os poetas”.
Irmão do meu momento: quando eu morrer
Uma coisa infinita também morre. É difícil dizê-lo:
MORRE O AMOR DE UM POETA.

E isso é tanto, que o teu ouro não compra,
E tão raro, que o mínimo pedaço, de tão vasto
Não cabe no meu canto.


HILST, H. In: Júbilo, Memória, Noviciado da Paixão. São Paulo: Companhia das letras, 2018.

quinta-feira, 9 de maio de 2024

Vovó Bernardina

Vovó Tardina dizia que não se importaria em morar num cortiço, se todos os familiares morassem ao redor dela. Era engraçado vê-la falando "curtiço", tá gravada na minha memória a voz dela falando "fi-inhu de vó" e o jeitinho que ela se emocionava toda vez que via "Dois filhos de Francisco". 

Feliz dia das mães, vó. 

quarta-feira, 8 de maio de 2024

Dias perfeitos

"Aparentemente simples em sua superfície, o filme é de uma riqueza inesgotável de sentidos e sensações. Uma sinopse possível diria que o que se narra ali são alguns dias na vida de Hirayama (Koji Yakusho, prêmio de melhor ator em Cannes), um homem solitário e lacônico de meia-idade que trabalha limpando banheiros públicos em Tóquio. 

Hirayama cultiva afeições anacrônicas: faz fotos com uma câmera analógica, ouve canções internacionais dos anos 1960 e 70 em fitas cassete, colhe mudas de plantas no bosque, etc. Mas não é alguém fora de seu tempo, muito pelo contrário. “Falam tanto em décadas e esquecem o minuto e o milênio”, dizia Caetano Veloso em seu “Manifesto do Movimento Joia”. Hirayama está pousado de corpo e alma no minuto e no milênio."

Disponível em: https://ims.com.br/blog-do-cinema/dias-perfeitos-por-jose-geraldo-couto/

To morrendo de vontade de ver esse filme, morrendo de vontade de falar ainda muitas vezes sobre a rotina e o encanto.