Imagine uma pessoa acordando pela manhã, você vê apenas o contorno, ainda não está tão claro a ponto de identificar as formas reais dessa pessoa. Então essa pessoa toma banho, escova os dentes e toma café da manhã. Você sempre vê o vulto mudando a medida que ela vai fazendo as coisas. Mudando no sentido de estar arrumado, estar mais ereto, menos sonolento.
Essa pessoa encontra no corredor uma vizinha que está indo para a escola. Essa vizinha não vê a mesma coisa que a gente, ela vê essa pessoa a uma distância ENORME e o vê como um tiozão, mesmo estando ao lado dele.
No trânsito sua cabeça vira um carro, no sinal, pela perspectiva do menino que faz malabares, vira um prato de comida. Quando chega no trabalho, sua cabeça fica achatada, seu chefe o vê da mesma corzinha e formato do piso debaixo dos pés. Mas tudo bem, hoje ele tem um encontro. Abre o celular e no lugar do rosto da moça, ele vê um belo filé.
Ao sair do trabalho, durante o encontro, sua cabeça se transforma num belo maço de dinheiro, ele foi de blusa social, afinal, a moça-filé está hipnotizada e da sua boca caem armadilhas, folhas e mais folhas de calendário - sempre com a mesma data: 01/04. E quando nosso protagonista percebeu, o drink esquentou, amanhã ainda é dia de trabalho, hora de voltar pra casa. Sozinho.
O celular toca. Mamãe! Sua cabeça virou a de um recém nascido. Conversou um pouquinho com a amável senhora-cabeça-de-fogão. Vou lá, mãe, cheguei em casa. Na porta do prédio um gatinho abandonado olha pra ele e pisca duas vezes. Vai chover. Um dia só não faz mal, não é?
O gatinho entra na casa ressabiado. O homem vai tomar banho e pensa no visitante mais uma vez, se olha no espelho e vê sua imagem, nítida. Que bom, perto da hora de dormir não estamos sendo observados.