É muito louco o jeito como a vulnerabilidade molda o pensamento de uma mulher. Aos 26 anos tenho decorados alguns macetes que passaram por gerações em minha família. Também tenho conhecimento acumulado de outras mulheres que, em nome do meu bem, me ensinaram, me deram dicas de... Como posso dizer? Acho que "sobrevivência" ainda é o termo mais adequado. Todos eles ficam acesos em minha mente, se estou sozinha.
"Sente atrás do motorista no ônibus."
"Sente de pernas bem fechadas."
"Grite 'fogo' no lugar de 'socorro'." (é mais efetivo para conseguir ajuda)
"Não volte a pé para casa se já estiver escuro."
E, caso eu me atrevesse ou precisasse andar na rua sozinha e tarde,
"Tenha o cabelo preso em um coque, mais difícil de te pegarem por trás"
"Mande sempre a sua localização para um conhecido ou finja estar falando com o namorado por telefone dentro do táxi/uber."
Hoje uso essa bagagem para me preparar para eventualidades, para saber agir caso algo aconteça. Sozinha, numa casa grande com homens fazendo obra, me peguei traçando estratégias antes de recebê-los: deixando a porta encostada (caso eu precise correr), com a chave já dentro da mochila (assim eles não conseguem trancar a casa comigo dentro). Eu não conheço as pessoas que trabalham nessa obra, mas isso não importa. Sei que são homens, e que mulheres - cis ou trans - precisaram desse tipo de educação para evitar danos físicos ou psicológicos ao longo dos anos. Se não acontecer nada, ótimo, se acontecer, tive uma horda inteira de mulheres por trás dos meus passos, me guiando para minha própria segurança.